17/10/2020

Aniquilação

“Considerava plausível que, na polícia, não se tivesse ligado ao facto, por exemplo, de os dois lugares, Auschwitz e Oswiecim, serem idênticos. Todos devíamos pôr-nos de acordo sobre isso, se recordássemos a incultura devastadora, a estupidez, a barbaridade e a malvadez, e a sua propagação contagiosa e aceitação oficial no país – mas, por assim dizer, tudo isso era apenas uma questão lateral e de apatia, como quem há muito já desistiu de melhorar, ou modificar, de qualquer maneira, o estado de coisas da nação. Pois, se não fosse assim, a tatuagem na coxa não se teria apresentado, então, como um grande enigma: porque se sabia que, nos poucos bebés nascidos no decurso da história de Auschwitz, o número de prisioneiro era tatuado na coxa, por ser demasiado pequeno o antebraço dos bebés.”
Imre Kertész – “Aniquilação” - 2003