“Considerava plausível que, na
polícia, não se tivesse ligado ao facto, por exemplo, de os dois lugares,
Auschwitz e Oswiecim, serem idênticos. Todos devíamos pôr-nos de acordo sobre
isso, se recordássemos a incultura devastadora, a estupidez, a barbaridade e a
malvadez, e a sua propagação contagiosa e aceitação oficial no país – mas, por
assim dizer, tudo isso era apenas uma questão lateral e de apatia, como quem há
muito já desistiu de melhorar, ou modificar, de qualquer maneira, o estado de
coisas da nação. Pois, se não fosse assim, a tatuagem na coxa não se teria
apresentado, então, como um grande enigma: porque se sabia que, nos poucos
bebés nascidos no decurso da história de Auschwitz, o número de prisioneiro era
tatuado na coxa, por ser demasiado pequeno o antebraço dos bebés.”
Imre Kertész – “Aniquilação” - 2003