“Ao fim da rua vi a catedral, e
avancei para ela. Quando pela primeira vez a vira, achara a fachada horrenda, mas
agora agradava-me. Entrei. Estava escura e sombria e os pilares iam por ali
acima, e havia gente rezando, e cheirava a incenso, e havia algumas janelas
maravilhosas. Ajoelhei e desatei a rezar e rezei por toda a gente que me
lembrei, por Brett e Mike e Bill e Robert Cohn e por mim, e pelos toureiros
todos, em separado por aqueles de quem gostava, e em massa o resto; depois
rezei outra vez por mim, e, enquanto rezava, dei comigo cheio de sono, e rezei
logo para que as touradas fossem boas e as festas fossem bonitas e para eu
pescar alguma coisa. Pus-me a pensar se havia mais por que rezar, e pensei que
gostaria de ter dinheiro, e rezei para ganhar uma data de dinheiro, e depois
pensei em como o havia de ganhar, e pensar em ganhar dinheiro fez-me lembrar o
conde, e comecei a pensar onde estaria ele e a ter pena de não o ter tornado a
ver desde aquela noite em Montmartre, e numa coisa cómica que Brett me contara
acerca dele, e, como durante este tempo estava de joelhos com a testa nas
costas do banco da frente e me considerava rezando, senti-me um pouco
envergonhado, e lamentei ser um tão safado católico, mas verifiquei que não
havia nada a fazer, pelo menos por algum tempo, talvez para sempre, mas que
era, apesar de tudo, uma grande religião, e eu apenas queria sentir-me crente, o
que talvez me acontecesse para a próxima vez; e saí para o sol ardendo nos
degraus da catedral, e o indicador e o polegar da mão direita ainda estavam
molhados, e senti-os secar ao sol. O sol estava quente e forte, e atravessei
para umas casas, e regressei por ruas laterais ao hotel.”
Ernest Hemingway – “Fiesta” - 1926
Sem comentários:
Enviar um comentário