“Eu não gosto de mim. Tenho
pouca simpatia por mim e ainda menos estima; além disso, não sou muito
interessante. Conheço as minhas principais características desde há muito e
acabei por me cansar delas. Em adolescente, e mesmo já jovem adulto, falava de mim,
pensava em mim, era como se estivesse cheio de mim; já não é o caso.
Ausentei-me dos meus pensamentos e basta a perspectiva de ter que contar
qualquer episódio pessoal para me sentir imergir num tédio semelhante à
catalepsia. Quando sou absolutamente obrigado a isso, minto.
No entanto, paradoxalmente,
nunca me arrependi de me ter reproduzido. Poder-se-á mesmo dizer que amo o meu
filho e que o amo mais ainda cada vez que reconheço nele vestígios dos meus
próprios defeitos. Vejo-os manifestarem-se no tempo, com um determinismo
implacável, e isso alegra-me. Alegro-me sem pudor por ver repetirem-se, e assim
eternizarem-se, características pessoais que nada têm de especialmente
louvável; que muitas vezes até são desprezíveis; que, na verdade, não têm outro
mérito senão serem minhas.”
Michel Houellebecq – “Lanzarote” - 2000
Sem comentários:
Enviar um comentário