“Depois tive de trabalhar no duro, e aí fiquei e nunca fiz mais nada. Nem viagens, nem nada. Passei a minha vida toda a arrumar a casa e a limpar a merda dos miúdos e a merda dos velhos de quem tomo conta. Só fiz asneiras. Ela pensava ter cometido erros, ter vedado o caminho, sem verdadeiramente o desejar, a um destino melhor, uma vida mais fácil e mais confortável, longe da fábrica e da preocupação permanente (ou antes: a angústia permanente) de não gerir como devia o orçamento familiar – um único passo em falso podia conduzir à impossibilidade de comer no final do mês. Ela não compreendia que a sua trajetória, aquilo a que chamava os seus erros, fazia, pelo contrário, parte de um conjunto de mecanismos perfeitamente lógicos, quase regulados previamente, implacáveis. Não se dava conta de que a sua família, os seus pais, os seus irmãos, irmãs, até os seus filhos, e a quase totalidade dos habitantes da aldeia, tinham conhecido os mesmos problemas, que aquilo a que chamava, portanto, erros não era na realidade senão a mais perfeita expressão da ordem normal das coisas.”
Édouard Louis - “Para Acabar de Vez com Eddy Bellegueule” - 2014
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