15/09/2007

O Melhor Café

O livro “O Melhor Café” editado em finais de 1996 constitui uma bela homenagem à Brasileira bracarense feita através das fotografias de Alfredo Cunha e das palavras de Pedro Rosa Mendes.
O livro abre com um texto, o mais longo de todos, que enquadra historicamente o surgimento d’A Brasileira em 17 de Março de 1907, iniciativa de Adolpho de Azevedo, próspero negociante do Porto. Nesta fase, a escrita segue de perto a pesquisa documental feita pelo autor, de onde transparece a Braga imutável, ontem como hoje, «a província como reserva cinegética do aborrecimento e os cafés como única alternativa de evasão à boçalidade medieval.» A Brasileira veio juntar-se a um punhado de outras casas de café e bilhares, onde os bracarenses buscavam convívio e jogo.
A ambiência económica, social e política da cidade no início do séc. XX surge enredada no quotidiano do café. O autor utiliza Joaquim Chaves (1903-1977), o cliente mais famoso da Brasileira, com direito a placa de mármore na parede, para servir de cicerone em várias narrativas sobre as décadas de Salazar e da PIDE.
Os textos aparecem intercalados com as fotografias, nunca se misturam. A um bloco de escrita segue-se um bloco de fotografias a preto e branco, sem qualquer tipo de texto ou legenda. A cada imagem está reservada uma página inteira, aparecendo mais esporadicamente uma fotografia a estender-se por duas páginas.
As imagens foram recolhidas em cinco dias do Verão de 1996, e retratam a fauna frequentadora do café, os empregados, os velhotes, o engraxador de sapatos e também as idiossincrasias do espaço e os pormenores do mobiliário. As fotos dos andares de cima, onde estão depositados os velhos bilhares e o mobiliário em desuso, são fantasmas dum tempo remoto que já não pode ser reencontrado.
Os quatro textos seguintes são curtos e têm um registo mais memorialistico, fruto das conversas desenroladas à mesa do café. Pretende-se oferecer múltiplos pontos de vista: do patrão, do empregado com mais de três décadas de casa, da velha viúva que é cliente diária há mais de 40 anos e fica perdida quando a Brasileira encerra para descanso semanal, e a Brasileira como ponto de encontro antes de jantar duma certa elite cultural, que tem como regra de ouro nunca se sentar na parte de baixo do café, embora não saiba explicar porquê?...
Das veredas da memória surgem histórias como a da actual Brasileira já ter sido dois cafés, em cima a Brasileira, e em baixo, pela Rua de S. Marcos o Café Sporting. O aparecimento da Brasileira Nova, em frente do outro lado da rua, sendo a Rua S. Marcos apelidada de “linha Maginot”: de um lado os progressistas, do outro os germanófilos.
As várias fases do café, dos padres Vaz, e dos outros clérigos em dias de feira, os clientes diários com horário certo e escrupulosamente cumprido, as coscuvilhices sussurradas e a maledicência longamente cultivada, o relance embaciado para o rio de gente que escoa pela rua abaixo, etc.
No ano da comemoração do centenário da Brasileira, lamenta-se que esta obra esteja indisponível nas livrarias, pois é um retrato de valor inestimável dum determinado microcosmos que metaforiza a sociedade bracarense do último século.
Alfredo Cunha e Contexto Editora, 1996
Textos de Pedro Rosa Mendes
Impresso em Novembro de 1996
116 págs. - 24,2 x 29 cm

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